sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

CRIMINOSOS VESTIDOS DE CORDEIROS


Como ganhar dinheiro, a matar pessoas, de forma sustentável.
por José Soares Ferreira
Hahahah hahha (lol em inglês) desculpem, hahah hahah eu já explico hahahaha, desculpem hahahha, ok, eu explico.

Estava eu a fazer investigação, usando os meus binóculos de ver ao perto para este artigo sobre o tema da sustentabilidade e cheguei a uma fórmula mágica, genial e ao título do artigo, pelo que vos vou revelar o meu percurso na construção do artigo.

Sustentabilidade “pode ser definida como a capacidade do ser humano interagir com o mundo, preservando o meio ambiente para não comprometer os recursos naturais das gerações futuras” numa óptica holística, ou seja abrangendo de forma equilibrada as pessoas, a sociedade, a economia e o ambiente, já que estamos todos ligados, todos usamos recursos naturais, animais e pessoas, no nosso passeio fugaz neste planeta.

Dito isto, resolvi, sem malícia, (não) confesso, visitar os sites de duas grandes empresas mundiais, a Apple e o Deutsche Bank (DB).

Não vos vou maçar com transcrições, a que podem aceder, mas qualquer uma delas pugna pela sustentabilidade, pela reciclagem, pela ecologia , pela cultura, pelo apoio social aos excluídos, pela educação e coisas assim. Os textos são tão bonitos que, confesso, fiquei com os olhos marejados de lágrimas e tive que parar de escrever. Pensei que, se estes gigantes internacionais, que estão no topo do mundo moderno e da economia, têm esta atitude, talvez exista esperança para a humanidade.

Eles estão a transferir milhões de euros e dólares para o bem das populações mais desprotegidas e a cuidar do ambiente e são empresas superpremiadas nos seus ramos de actividade, por ex., em 2012 o Deutsche Bank foi eleito, pela terceira vez, Best Global Investment Bank, pela Euromoney.

Mas, (existe sempre um mas), como já tinha arrumado o tema deste artigo, e porque não tenho mais nada que fazer, continuei à procura de mais notícias na internet sobre estes meus novos heróis da cidadania global e (existe sempre um e...) e , dizia eu, descobri (literalmente) uma bomba.

Numa assembleia de accionistas do DB, em Frankfurt, Abril de 2012, foi denunciado que o DB investia em fábricas de minas-anti pessoais de fragmentação, proibidas pela ONU, pela CE e pela Alemanha! Diz a notícia: “ o Deutsche Bank concedeu créditos para a construção de material bélico em vários países como, por exemplo, os EUA. Assim, as empresas de guerra americanas Textron Incorporated, General Dynamics e a Lookheed Martin Corporation, entre outras, receberam financiamento do Deutsche Bank para a construção das proscritas bombas de fragmentação, com os terríveis e conhecidos efeitos mutiladores nas pessoas”.

Vim a constatar que outros bancos também investem em bombas de fragmentação, como o nobre LLoyds Bank inglês e a seguir, após ter falido, ter sido recapitalizado pelo governo, com impostos públicos.

Mal recomposto por esta descoberta, fui comer um pêro e, a propósito, resolvi ir ler o ”Foodwatch-Report de 2011”, relatório duma organização não-governamental, que observa as condições de financiamento, produção e distribuição dos bens alimentares no mundo.

“O relatório expõe, como a pura especulação com o trigo, milho, arroz, óleos, leite e outros bens alimentares nas ‘bolsas de matérias-primas’ - pelo Deutsche Bank, Barclays, Morgan Stanley, UBS e Goldmann & Sachs- tem contribuído para o brutal aumento dos seus preços, tornando-se a alimentação, cada vez mais inacessível para as populações pobres, em grande parte do mundo.

Assim, dois mil milhões de pessoas, sobretudo de África, da Ásia e da América Central gastam já a maior parte do seu rendimento na alimentação. Desnutrição, fome e morte são as consequências mais cruéis do aumento dos preços.”

Confuso, optei por ir ler sobre a Apple e (existe sempre um e...) encontrei uma notícia do The New York Times, de Janeiro de 2012, onde se denuncia as condições de semiescravatura da produção dos ipods e afins na China e onde relata que um alto funcionário da Apple afirmou: “Nós já sabíamos há quatro anos dos abusos de trabalho em algumas fábricas e, mesmo assim, eles ainda estão acontecendo. Porquê? Porque o sistema funciona para nós.”

Um outro dirigente da Apple afirmou que os seus clientes não estavam preocupados com isso, mas com as funcionalidades dos aparelhos.

Existem notícias sobre o trabalho escravo de empresas como a MacDonald’s ou a Zara, neste caso, no Brasil, com imigrantes.

E aí, confesso, comecei a rir, tipo hahahaha (lol em inglês).
Estes factos demonstram, inequivocamente, que é possível ganhar dinheiro matando pessoas, umas devagar, através da escravatura, outras depressa, com bombas e outras mais devagar ainda, pela fome e ser, simultaneamente, considerado uma empresa responsável socialmente.

Parece que, assim, é crime capital mandar baterias de telefone para o lixo, mas não pessoas, não é curioso?

Ou seja, as grandes corporações continuam a saquear recursos do planeta, de forma impiedosa e ao mesmo temo, tentam lavar a sua imagem sob a capa da sustentabilidade e da responsabilidade social e… conseguem!

O que é mais estranho, é que no mundo de hoje qualquer pessoa pode ter acesso a esta informação e, a maioria de nós sabe ler. Mas compreenderemos o que lemos?

Existe um debate sobre a validade da dicotomia lucro/social, em que é assumido que as empresas busquem estritamente o lucro, e o 3º sector, o social, cuida da sociedade.

É um paradigma perigoso, já que assume que as empresas podem destruir o planeta e a vida das pessoas, na busca da maximização do lucro, como se não dependessem desse mesmo planeta e dessas mesmas pessoas, para a formação do valor acrescentado para os seus accionistas.

A questão é que esses danos ambientais e humanos não são contabilizados nos seus balanços, permitindo assim produzir lucros privados astronómicos e deixando os prejuízos para as populações pobres e indefesas.

Se as empresas suportassem os custos da utilização desses recursos, como por exemplo já se faz com o “mercado de carbono”, teriam menos lucros, ou mesmo, seriam insolventes.

A sustentabilidade e a responsabilidade social das empresas, não pode ser uma espécie de máquina de lavar imagens e crimes contra a humanidade; deve ser uma prática absoluta a todos os níveis da sua actividade.

E fica-me a bailar a pergunta: é certo que sabemos ler, mas compreenderemos? E se compreendemos, o que faremos com isso?

“O sistema funciona para nós”?
Já compreendem a fonte da minha alegria ?

José Soares Ferreira é Presidente do Tree Institute, especialista e investigador em comportamento empreendedor e criação de negócios. Jose@tree-institute.org

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